domingo, 3 de junho de 2007

Viver não dói

Viver não dói
( Carlos Drummond de Andrade )

Definitivo, como tudo o que é simples.
Nossa dor não advém das coisas vividas,
mas das coisas que foram sonhadas e não se cumpriram.
Por que sofremos tanto por amor?
O certo seria a gente não sofrer, apenas agradecer
por termos conhecido uma pessoa tão bacana,
que gerou em nós um sentimento intenso e que nos fez companhia por um tempo
razoável, um tempo feliz.
Sofremos por quê?
Porque automaticamente esquecemos o que foi desfrutado e passamos a sofrer
pelas nossas projeções irrealizadas, por todas as cidades que gostaríamos de
ter conhecido ao lado do nosso amor e não conhecemos,
por todos os filhos que gostaríamos de ter tido junto
e não tivemos, por todos os shows e livros e silêncios
que gostaríamos de ter compartilhado, e não compartilhamos.
Por todos os beijos cancelados, pela eternidade.
Sofremos não porque nosso trabalho é desgastante e paga pouco, mas por todas
as horas livres
que deixamos de ter para ir ao cinema,
para conversar com um amigo, para nadar, para namorar.
Sofremos não porque nossa mãe é impaciente conosco,
mas por todos os momentos em que poderíamos estar confidenciando a ela
nossas mais profundas angústias,
se ela estivesse interessada em nos compreender.
Sofremos não porque nosso time perdeu,
mas pela euforia sufocada.
Sofremos não porque envelhecemos,
mas porque o futuro está sendo
confiscado de nós, impedindo assim que mil aventuras nos aconteçam, todas
aquelas com as quais sonhamos
e nunca chegamos a experimentar.
Como aliviar a dor do que não foi vivido?
A resposta é simples como um verso:
se iludindo menos e vivendo mais!
A cada dia que vivo, mais me convenço de que
o desperdício da vida está no amor que não damos,
nas forças que não usamos, na prudência egoísta que nada arrisca, e que,
esquivando-se do sofrimento, perdemos também a felicidade.
A dor é inevitável.
O sofrimento é opcional.

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